A afirmação radical de Merleau-Ponty de que “nosso corpo não está no espaço: ele é o espaço”.E, para exemplificar, o filósofo descreve diversas experiências, entre elas, a experiências de Stratton sobre a inversão das imagens em um dado campo perceptivo, através do uso de óculos apropriados para inverter as imagens retinianas. Nessas experiências, apesar da inversão do campo, o sujeito continua identificando o mundo sem precisar se utilizar de conceitos porque vive nele, ele não lhe é estranho; ele aí coloca o seu centro de gravidade. No começo da experiência o campo visual parece distorcido e irreal, porque o sujeito não vive nele e, portanto, o desconhece. Aos poucos, porém, a ele vai se acostumando ao estabelecer relações orgânicas. Essa possessão do mundo pelo sujeito, através do seu corpo, é que dá origem ao espaço. Merleau-Ponty : “que o fato de que nós ficamos em pé não pela mecânica do esqueleto ou mesmo pela regulação nervosa do tônus, mas porque estamos engajados num mundo, se este engajamento se desfaz, o corpo afunda e se transforma em objeto”. Outro exemplo característico pode ser pinçado na literatura infantil. As histórias de Lewis Carrol, Alice no país da maravilhas e Alice no país dos espelhos. Quando Alice caiu no buraco da árvore, o mundo lhe pareceu às avessas e ela pensou enlouquecer: “Oh, céus, a que latitude e longitude estarei?” Mas, com a continuidade do seu sonho, ela se habituou ao mecanismo de crescer e decrescer, subir e descer, engordar e emagrecer, andar de cabeça para baixo, tomar chá com o chapeleiro louco, conversar com uma lagarta e ver aparecer e desaparecer um gato muitíssimo esquisito. Dessa maneira, ela consegue estruturar a sua realidade conforme o referencial dado. Observemos esta passagem do relato: “Nisso, ela viu, debaixo da mesa, uma caixinha de vidro. Abriu-a e encontrou um bolinho com confeitos prateados formando a palavra COMA-ME. _ Bem, vou comê-lo _ disse Alice. _ Se eu crescer bastante, apanho a chave. Se, ao contrário, encolher mais, passo debaixo da porta. De todo jeito, entrarei naquele maravilhoso jardim. Nada mais importa!”. As colocações de Merleau-Ponty sinalizam para o fato de que a realidade “em si” é inapreensível como tão bem demonstrou Kant com o conceito de noumeno (do grego noûs, espírito), nós só podemos apreender o fenômeno tal como ele aparece para as nossas sensações, daí que o real seja sempre “para-si”, constituído juntamente com a corporeidade: “Todo vivido é vivido sobre o fundo do mundo”. Por isso, podemos perceber um sem número de realidades correspondentes a diversos modos de estruturação do espaço e de sua fixação ao mundo; esses espaços são antropológicos porque são abertos pelo homem: a realidade do adulto que se considera “civilizado”, a do primitivo, a infantil, a do doente mental, a da arte, a do matemático, a do místico, e por aí vai. Além do mais, cada um tem seu mundo privado, ao lado dos demais: “O mundo, diz Maria Seabra, “é o lugar do encontro, onde nós reencontramos os instrumentos que construíram nosso próprio mundo”. A única certeza infalível é a da própria vivência. Portanto, ela é sempre uma experiência emocional, vale dizer, na encruzilhada da intensidade e do embate das forças.
Pesquisa/texto- sueliaduan
Título no blog-sueliaduan
Corpo e Potência no Pensamento de Merleau Ponty
Maria Helena Lisboa da Cunha
Visão e Corporeidade em Merleau Ponty
Bernadete Franco Grilo Machado
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